Um rio nasce do nada, tal como as estrelas são douradas e o fogo é incandescente. A água corre, enrola-se e serpenteia. Da nascente até à foz. A vida inteira.

Para pensar

domingo, 28 de outubro de 2007

Restos



Já nada resta aqui.
Partiram todos para o outro lado do rio,
faz muito tempo.
Despeço-me hoje e volto amanhã
porque haverá menos gente.
Não interessa procurar,
estão todos no devido lugar
e nada me pertence.



Já se foram embora.
O sino toca a toda a hora
para avisar da solidão que me espera.
É tão tarde por ser assim,
nem há Primavera que me alegre
estou sozinho, enfim.

Ouvem-se os gritos daquela miúda
que sabe tudo quanto há-de ter,
que escolhe quem amar
para nem sequer ter prazer...
Sempre me enganei por estar certo
neste eterno espaço aberto
onde um dia entrei.
Que me resta fazer por cá,
senão procurar aquilo que não há
e com sempre sonhei?


Alexandre Reis (K3)

sexta-feira, 19 de outubro de 2007

Ideias coloridas



Quero ter-te em todas as ideias
à procura das cerejas
que florescem nas aldeias
e dos flamingos
que pintam quadros ao pôr-do-sol
nas cores que trouxeres
na tua saia de guizos
no teu colar de sentidos
nos naufragantes vestidos
nas cores em que somos felizes!

Alexandre Reis (HX-MC)

sexta-feira, 12 de outubro de 2007

Sublime



Se nada mais existe
para lá do pensamento
deixem-me viver aí sempre.
Nessa imensidão do desconhecido
que navega pelo infinito
e cresce cá dentro.

Não há nada mais sublime
do que amar cada ciúme
que tenho de mim.
Nem a vã sensatez de querer
ser mais alto que o céu
e descobrir ouro nas estrelas.

Alexandre Reis (HX)

quarta-feira, 3 de outubro de 2007

No Vale do Leva (II)



Hipnotismo de luz pelas arestas das manhãs
passadas nos rios que nos banham,
hipopótamos gigantes reconfortados com a lama do paraíso.
Botões, écrans e papéis. Discursos e campainhas.
Campanhas de automóveis de fumo no bebedouro dessa aldeia
pintada de baton que embeleza a saúde.
Raízes destroçadas, canos entupidos, electricidade inconstante.
Vidros partidos, sabor a aperitivos, sacos de espuma elástica,
pastilhas, olivais abatidos, tesouras de coito interrompido,
ceroulas penduradas nas janelas, telhados de vidro - estaladiço.
Bicas de almoço e cigarros de incenso:
a química das coisas é o cerne do conhecimento.
Lâmpadas claras noite dentro iluminam caras
debruçadas sobre mesas, num convento.
Semáforos cinzentos, dias mundiais do envelhecimento,
muralhas semiderrubadas pelo vento.
Linhas de alta velocidade com o rápido destino
da capital, terramoto dos acontecimentos.

Somos nós que nos amamos; Somos egoístas...

Alexandre Reis (x)